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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

"Médico precisa gostar de gente" - observações dum médico

Mais um texto de outra pessoa que resolvi recompilar aqui. Encontrei na revista Serafina de janeiro de 2011. Essa revista acompanha a Folha de São Paulo, jornal que meu tio sempre lê.

O autor do texto é "David Uip, diretor do Instituto de Infectologia Emilio Ribas e professor livre docente da Universidade de São Paulo, em depoimento a Silvia Crespi." (Estava escrito no final do texto). Neste texto ele fala da relação médico-paciente, tendo como base a série "House".

Com vocês, David Uip

"Médico precisa gostar de gente!"

Assim como eu, o dr. House da série americana é infectologista e chefe de departamento de um hospital. E, assim como ele, faz parte da minha rotina chegar aos diagnósticos mais difíceis. Em moléstias infecciosas, o médico tem um índice de sucesso muito grande. Mas as semelhanças param por aí.

Só na ficção um médico pode ser tão arrogante, distante dos pacientes e descompromissado com sua equipe. Eu já vi de tudo, só não vi um indivíduo estúpido e grosseiro ser tão bem sucedido. Na minha experiência esse tipo de pessoa sempre acaba se dando mal.

Também sou contra alguns métodos que ele usa para chegar aos diagnósticos, quebrando protocolos do hospital. Dessa forma você perde a noção de certo e errado, e quando o errado entra em sua rotina e você se convence dele...o perigo aumenta.

Todo médico é muito vaidoso e, assim como o House, todos se sentem um pouco 'Deus'. O motivo é que realmente ajudamos as pessoas. Mas, na vida real, essa vaidade só existe até que se tome a primeira paulada. Para os infectologistas, a maior paulada aconteceu na década de 80 com o advento da AIDS. Naquele tempo não havia praticamente nada que pudéssemos fazer. A AIDS mostrou aos médicos que a ciência tem limites.

Um outro exemplo que serviu para me colocar em meu lugar foi a doença do ex-governador Mário Covas. Ele teve a sua disposição os melhores recursos, materiais e humanos, do mundo (médicos de diversos países participaram do tratamento), e, mesmo assim, morreu.

Na série, também é muito distante da realidade a quantidade de exames complementares diagnósticos (de laboratório, de imagem) a que o dr. House submete seus pacientes, sem limite de verbas e praticamente sem contato humano. É claro que ninguém  pode abrir mão desses exames. Mas tudo começa com a relação médico-paciente. Eu resolvo 90% dos casos com a história contada pelo doente e pelo exame físico. Para isso uma coisa fundamental que parece que o amigo House não vai conseguir nunca: médico precisa gostar de gente!